Quarto 733
O quarto do suicídio. Era assim que eles apelidavam o quarto 733 – como se eu já não tivesse muito para me preocupar no primeiro dia –.
Nós tínhamos ficado com o 734 no Reilly, que por falar nisso, não estava na área mais bonita do prédio da ala sul. Não, nós nos encontrávamos na parte mais velha do prédio, mais precisamente no 7º andar.
No entanto, eu não fiquei tão chateada, pelo menos eles aceitaram que eu ficasse junto com a minha melhor amiga.
Lydia e eu ficamos a maior parte da manhã dentro do quarto, quando a supervisora passou por nosso quarto eu estava colocando alguns pôsters na parede e Lydia estava lendo.
“Olá, garotas. Eu sou a Beth!” Piou a garota loira enquanto entrava no nosso quarto. “Vou ser a supervisora de vocês esse ano.”
“Oi.” Fiz que sim com a cabeça para ela.
“Nossa, vocês são bem rápidas.” Ela disse, olhando para nossas camas arrumadas e nossas roupas dobradas. Beth pegou um desenho do Cthulhu* que Lydia havia feito nesse verão e começou a examiná-lo. “Esse é o Kraken, de Piratas do Caribe?”
Lydia a encarou com o livro ainda em mãos. “Ah, então—” Beth continuou “Eu sei que nossa ala não é tão nova quanto a ala sul, mas pode acreditar, tem bastante história aqui. Essa ala tem quase 60 anos.”
“É, dá pra perceber.” Eu disse e passei os olhos no quarto “Os quartos são bem pequenos.”
“Bom... as pessoas eram menores nos anos 50.” Beth deu de ombros.
“Sério?” Lydia disse, mostrando muito pouco interesse.
“Sim, sério.” Beth franziu os lábios e ficou parada lá enquanto o quarto se enchia de silêncio desconfortável.
“Então...” Eu disse, “O último quarto, vizinho ao nosso—733? Não é? Ele parece bem maior que esse... Ele já esta ocupado? Se não tiver talvez a gente possa—”
“Você não vai querer aquele quarto.” Beth interrompeu, “Houveram alguns suicídios lá. Enforcamento e... já saltaram da janela também se eu me lembro bem. Eles não permitem que ninguém pegue aquele quarto... E eu gostaria de lembrar que esse andar é somente para garotas, e garotos não são permitidos depois das 23.”
Antes que pudéssemos responder, Beth deu uma palminha e disse “Bom, foi legal conhecer vocês.” E saiu do quarto.
Lydia derrubou o livro na cama e fitou a parede. “A odeio.”
“Você ouviu o que ela disse?”
“O novo apelido dela é Beth Imbecil.”
“Lydia, estou falando sério. Suicídios?”
“Becca, relaxa. Todo campus tem alguns suicídios.”
“Tá, mas... no mesmo quarto?”
Lydia suspirou. “Quem liga? Não é nosso quarto.”
“É verdade.” Eu me virei para a pequena janela no nosso quarto. “Dá pra imaginar subir até essa janela minúscula e se jogar? Você ficaria viva por no máximo 5 segundos antes de chegar ao chão.”
“Porra, Becca. Dá pra parar?” Lydia passou os olhos na janela e fez uma careta. “Você sabe que eu odeio altura e só de falar disso já aumentou minha pressão.”
“A gente bem que podia pegar o quarto do suicídio” Eu provoquei, “Ele tem uma janela em cada lado.”
“Não fode.”
“Ok, ok. Mas sério, pensa nisso. Seria preciso muito esforço pra sair por essa janelinha.”
“Pois é, mas vale lembrar que as pessoas eram bem menores naquela época.” Lydia murmurou enquanto puxava sua cama para longe da janela.
Lydia era extrovertida e fácil de lidar e isso fez com que conseguíssemos amigos mais rápido do que pensei, nós fomos em um monte de festas nas primeiras semanas e em um delas, Lydia conheceu um cara. Eu a conhecia desde que saí das fraldas então eu dei um palpite de que ela estaria namorando ele até o final de Setembro. O nome dele era Mike e ele não era nada especial; apenas o padrão e fazia parte de uma fraternidade.
Depois de mais ou menos um mês no campus nós diminuímos as festas e focamos mais nos estudos, passando mais fins de semanas no quarto do que fora. As notas do semestre estavam quase saindo e eu pretendia manter uma nota boa no meu primeiro ano.
Uma noite no começo de Outubro eu fui acordada por um rangido alto e insuportável; eu sentei na cama e fiquei tentando ouvir novamente, Lydia também estava acordada e tentando escutar.
SLAM
Mas que porra? Ela murmurou para mim.
Não era fora do normal ouvir barulhos no corredor, até porque muitas pessoas chegavam das festas altas horas da noite. Mas esse som definitivamente estava vindo do quarto ao lado.
GRIND
“Isso é—?”
“Sim—” Ela sussurrou. “É a janela do quarto ao lado.”
Por culpa da insistência de Lydia a nossa janela havia ficado fechada desde sempre. No entanto, não tinha como dizer que não era a janela do quarto 733 abrindo e fechando pausadamente.
SLAM
“Quem está lá?”
Lydia deu de ombros.
“Será que tem alguém tentando assustar a gente? Tipo alguma iniciação ou brincadeira?”
Lydia levantou uma sobrancelha. “Iniciação pra que?”
“Eu sei lá, universidade? Talvez estejam brincando com os calouros?”
GRIND (Abriu novamente)
“E quem estaria brincando com os calouros?”
Eu dei de ombros.
SLAM (fechou)
“Becca, eu te amo, mas isso foi estúpido.”
Eu joguei uma almofada nela. “Seja quem for, vai pedir pra eles pararem.”
“Eu? Eu não vou arriscar ser jogada da janela!”
GRIND
“Eu sei que eu não vou...”
“Eu estudo artes e você, ciências políticas, então você vai lá e manda eles pararem!”
“Não fode.”
“Então chama a Beth Imbecil, não é ela que tem que lidar com essa porcaria sem sentido?”
SLAM
“Eu não vou chamar ela, não joga isso pra cima de mim.”
“Então tá,” Lydia sussurrou de forma mais alta “a gente vai ter que ignorar.”
“Eu tenho aula ás 07:30.” Eu sussurrei.
GRIND
“Então faz alguma coisa.”
“Ugh!” Eu levantei da cama e abri a porta com força e dramaticamente e comecei a andar em direção ao quarto 733 onde havia um pequeno aviso que simplesmente dizia “Quarto de Suprimentos”.
“Tem gente tentando dormir, para com essa merda!” Eu disse e não recebi resposta.
SLAM
“Cara é sério...” Eu tentei abrir a porta e imediatamente percebi o problema, o quarto 733 estava trancado por fora. Eu soltei a maçaneta e praticamente corri para o meu quarto.
“O que aconteceu?” Lydia perguntou.
“Eu não vou nem passar perto daquela merda de quarto de novo. Está trancado por fora, eu não sei como alguém conseguiria entrar lá.”
“Então você está dizendo que tem um fantasma lá?” Lydia sorriu.
“Não, eu estou falando que tem uma porcaria assustadora acontecendo naquele quarto que por acaso é chamado de ‘quarto do suicídio’”
Lydia suspirou e rolou na cama para tentar dormir. “Você deveria estudar drama.”
Nós não ouvimos a janela naquela noite novamente e na manhã seguinte estava claramente visível que as janelas do quarto estavam completamente abertas.
Eu observei as janelas durante uma semana e elas continuaram abertas.
Durante as noites, eu achei ter escutado várias vezes objetos rolando no chão.
Lydia nunca acordava com esses barulhos, então eu não dizia nada a ela.
Durante uma tarde eu estava sozinha editando algumas notas no notebook, eu estava usando fones, mas a música não estava alta o suficiente para me impedir de escutar o barulho de alguém batendo na porta.
“Entra.” Eu disse sem tirar os olhos da tela. Um momento se passou e eu ouvi novamente a batida, tirei meus fones e fechei o notebook.
“Pode entr—” Eu comecei, virando para olhar.
Que merda. A porta estava completamente aberta, e eu havia deixado aberta de propósito já que Ian (Um garoto que eu estava ficando) ia passar por lá. Eu ouvi a batida novamente, atrás de mim e eu literalmente pulei da cadeira.
Dessa vez estava vindo do outro lado da parede – o closet. O closet que ficava na parede dividida com o quarto 733.
“Lydia, isso não tem graça.”
Nada.
“Lydia, eu juro por deus eu vou socar sua cara.”
Silencio.
Eu andei até o closet e segurei a maçaneta. “Lydia, você é uma completa—”
“Completa o que?” Ouvi a voz dela vindo do corredor – atrás de mim. Eu soltei a maçaneta e dei passos para trás, meus olhos estavam arregalados. Lydia jogou as coisas dela na cama e virou para mim, cruzando os braços.
“Uma completa o que?”
“Eu—eu achei que você estava se escondendo no closet.” Eu disse.
“O que? Por quê?”
“Porque alguém estava batendo na porta.”
“Meu Deus, Becca.” Lydia disse, passando uma mão na testa e indo em direção ao closet, abrindo as portas logo em seguida. Não havia nada lá além de roupas e caixas. Ela estendeu um braço para o closet como se estivesse dizendo “Viu?”
“Eu juro—”
“Becca, não tem nada aqui.”
“Eu sei o que eu ouvi.”
Nós ficamos uma fitando a outra até que nossa pequena discussão foi interrompida pela chegada de Ian. Ele imediatamente sentiu a tensão no quarto.
“Oi, moças... quais são as novidades?”
Eu continuei fitando Lydia de uma maneira não muito amigável. “Tem alguma merda acontecendo no quarto vizinho, mas isso não é novidade.”
“Qual? O 735 ou o vazio?”
“O vazio.” Lydia falou enfatizando a palavra‘vazio’.
“733... Bom, eu não estou surpreso, é o quarto do suicídio.”
“É, nós ouvimos falar sobre as mortes.” Eu sentei na cama.
“É bastante esquisito, três suicídios em apenas um quarto.”
“Três?” Lydia disse, franzindo o cenho. “Nos disseram que foram dois.”
“Bom, teve um casal nos anos 70 e depois um cara... uns 10 anos depois. Ele pulou da janela.”
Eu e Lydia nos olhamos, assustadas, e mesmo sabendo que era ela que tinha medo de altura, eu não conseguia imaginar uma morte pior do que essa.
“Eu admito que três suicídios no mesmo quarto seja perturbador.” Ela disse, num tom mais calmo, como se estivesse pedindo desculpa.
“Eu ouvi que tem algo lá.” Ian disse.
“Tipo o que?”
“Ninguém sabe, mas todo ano alguém aparece com uma teoria nova, geralmente perto do Halloween alguma coisa é publicada no jornal do campus—mas seja o que for eu não acho que seja amigável.”
“Mais alguém já se matou em outro quarto?”
“Não, só o 733. Eu fiquei surpreso quando ouvi que iam abrir a ala norte esse ano.”
“Eles nos disseram que essa era a maior turma de calouros em 20 anos.”
“É, eu ouvi isso também. Vocês podem sempre pedir uma mudança de quarto.” Ian disse, sentando na cama e eu me apoiei nos ombros dele.
“Eles não iam nos deixar juntas novamente.” Lydia interrompeu. “Becca e eu somos melhores amigas desde pequenas, nós não vamos dividir quarto com outras pessoas.”
“Então a gente vai continuar aqui, vivendo do lado de Satã?” Eu fitei a porta novamente e Lydia deu de ombros. “Pelo menos vamos ter algo pra contar depois que nos formarmos.”
“Esses não são os tipos de história que quero contar.”
Alguns dias depois, Lydia começou a acreditar na minha história do closet. Eu acordei no meio da noite com o som de alguém sussurrando, olhei para Lydia e ela já estava olhando de volta, com olhos arregalados.
Ela levou um dedo aos lábios lentamente.
Eu ouvi calmamente, tentando entender o que a voz estava dizendo e de onde estava vindo, mas eu não conseguia entender uma palavra sequer. Eu levantei da cama na ponta dos pés e fui para a cama de Lydia.
Os sussurros estavam definitivamente mais altos lá, provavelmente porque a parede dela era a mesma do 733. Eu tentei escutar novamente.
Nunca......pega....bocas....dos idiotas.....
Mas que porra? Lydia encostou a orelha na parede e os suspiros simplesmente sumiram e eu encostei-me à parede logo em seguida. De repente, ouvimos um alto “bang” do outro lado, o que fez com que Lydia tirasse o ouvido da parede e choramingasse de dor, colocando uma mão no ouvido.
Alguém estava lá.
Com mais raiva do que medo eu abri a porta do quarto e fui em direção ao 733, batendo meus punhos com força na porta, não me importando se alguém iria acordar ou não.
“Você tá’ de brincadeira?” Eu gritei para a porta. “Essa merda não tem mais graça. Sai desse quarto, seu otário.”
Silencio.
E então a maçaneta começou a girar.
Eu não sei o que eu esperava, mas com certeza não era aquilo, eu me afastei tão rápido da porta que me bati na parede em frente. Assim que a maçaneta foi girada por completo, a porta começou a abrir, um rangido insuportável começou, mas a porta não foi totalmente aberta, pois a fechadura não permitiu.
Eu segurei a respiração até que a pressão na maçaneta sumiu e ela voltou á posição normal.
Eu percebi que Lydia estava olhando do nosso quarto e suspendeu as mãos como se perguntasse “o que aconteceu?”
“Alguém se acha muito engraçado.” Eu respondi em voz alta, ela balançou a cabeça e voltou para dentro do quarto.
Eu ajoelhei e apoiei minha cabeça no chão, tentando ver por debaixo da porta, foi a primeira vez que vi o quarto por dentro.
O quarto 733 era definitivamente um quarto de suprimentos. Havia cadeiras encostadas na parede e cabeceiras de camas por todos os lados, alguns colchões estavam empilhados perto de uma das janelas e uma grande camada de pó cobria tudo que lá estava. As janelas eram absurdamente grandes e ninguém poderia notar isso se apenas olhasse para o prédio de longe.
Elas estavam abertas como sempre e eu poderia imaginar perfeitamente uma pessoa subindo e entrando no quarto de fora para dentro.
Mas o quarto não parecia que tinha sido mexido em algumas décadas, o que me fez sentir um frio na espinha.
A luz da lua, que por sinal era a única coisa me ajudando a enxergar dentro do quarto, simplesmente sumiu e a única coisa que eu conseguia ver era escuridão. Eu pisquei rapidamente antes que meus olhos começassem a doer e um momento depois, fechei eles novamente, apertando-os. Quando o abri novamente havia um grande olho amarelo me encarando de volta, apenas alguns centímetros distantes de mim do outro lado da porta.
Eu gritei e acordei metade do dormitório.
Não havia como negar que algo estava escalando a parede.
Na manhã seguinte, Lydia e eu deixamos os pedidos para mudança de quarto na direção e esperamos pelo melhor, e enquanto isso, nós duas combinamos de não dormir ou ficar nos dormitórios sozinhas, principalmente à noite. Nós começamos a passar a maioria das noites com nossos namorados.
Eu contei a Ian o que havia acontecido e ele sugeriu que eu falasse com a Sociedade Paranormal do campus. Eu marquei um horário, e nós (eu e Lydia) nos encontramos um garoto chamado Craig e quatro de seus “companheiros” na Terça seguinte.
Nós contamos tudo pra ele, do menor ao maior incidente, não importa quão pequeno parecesse. Craig e seus companheiros ficaram escutando e anotando coisas por quase 30 minutos, só falaram algo depois que nós terminamos.
“Isso é tudo?” Craig perguntou.
“Sim.” Eu disse, calmamente.
“Vocês se importariam de esperar lá fora? Eu gostaria de discutir algumas coisas com meus companheiros.”
“Não.” Lydia sorriu e levantou. “Qualquer coisa.”
A porta mal tinha fechado atrás de nós e Lydia rolou os olhos e falou: “Vamos embora.”
“Para onde?”
“Você está falando sério?”
“Lydia, qual é?! Nós precisamos de ajuda, eu estou pirando. A gente não ficou uma noite sequer no nosso dormitório desde o que aconteceu, isso não é algo que a gente simplesmente esquece.”
“Tá.” Ela levantou as mãos. “Vamos ouvir o que eles têm a dizer e depois verificar o que fizeram em relação aos nossos pedidos dos quartos.”
Nós ficamos no corredor durante uns 15 minutos e Craig apareceu na porta, engolindo em seco e deu seu diagnostico.
“Vocês estão lidando com um fantasma muito raivoso, moças.”
“Essa é sua opinião profissional, Craig?” Lydia disse e eu a fitei.
“Sim, um espírito—”
“Um espírito?” Eu perguntei, duvidando muito que era aquilo que estava lá.
“Sim.” Respondeu um dos amigos de Craig. “Isso significa fantasma, para os leigos.”
“Pelo amor de Deus!” Lydia falou e massageou as têmporas.
Confundindo a frustração de Lydia com desespero, Craig se apressou na resposta: “Vocês não precisam ficar com medo, nós vamos tomar conta de vocês. É verdade que espíritos podem ser uma dor de cabeça se as pessoas não sabem lidar com ele, e é bom que vocês tenham vindo á nós. Suicídios quase sempre resultam em espíritos raivosos, eles precisam se vingar.”
“De quem?” Eu perguntei.
“Outros estudantes, talvez esse espírito tenha sido incomodado de uma maneira exagerada, o que pode ter feito com ele tirasse a própria vida e agora ele atormenta os outros.”
“Escuta—”
“Nós podemos tomar conta disso pra vocês agora mesmo, tudo que pedimos é uma contribuição para a nossa sociedade,” Craig continuou. “Nós não tínhamos ideia de que havia tanta atividade assim no quarto, é realmente muito interessante.”
“Ótimo, bom... Obrigada pelo seu tempo.” Lydia disse enquanto agarrava minha mão e me puxava pra fora.
“Vocês querem marcar algo para esse fim de semana?” Craig perguntou.
“A gente te liga!” Lydia disse puxando minha mão ainda mais e me jogou olhares, nós não falamos nada até alcançarmos o prédio da administração.
“Aquilo foi uma perda de tempo.” Ela disse.
“Olha, eu não discordo de você, mas—”
“Becca, não me diz que você acreditou naquilo?”
“Então você não acha que seja um—” Eu estava tendo problemas em dizer a palavra, soava ridículo. “...fantasma?”
“Eu não sei, mas eles também não! Aquele cara não fazia idéia do que ele estava falando.” Abaixei o capuz do casaco enquanto nós entravamos na administração do campus. “Deixa eu te explicar, eles tão brincando de Ghostbusters e nós estamos vivendo na porcaria do O Exorcista.”
“Tá,” Eu suspirei. “E o que você quer fazer? Dormir no Mike e no Ian até recebermos outros quartos?”
“Eu só quero que isso acabe.” Lydia disse, cruzando os braços e olhando pra frente. Nós duas queríamos que isso acabasse, se pegássemos um quarto longe daquele não seria mais tão assustador, mas ainda assim seria um incomodo.
“Ok, bom, provavelmente nós estamos salvas durante a luz do dia então é só não passar as noites lá que estamos bem. Não é como se o fantasma estivesse lá dentro, e nossos pedidos devem sair logo.” Eu chequei meu relógio. “Merda, são quase 14:00!”
“Nossa, sério? Eu tenho que ir, Mike foi aceito na Sigma Chi e a iniciação dele é hoje.”
A garota na mesa acenou para nós, e eu nem havia percebido que já estava na nossa vez até aquele momento. “Me diz o que eles decidiram depois,” Lydia disse enquanto corria para a porta, a garota na mesa me olhava suspeita enquanto eu me aproximava. “Oi, eu sou—”
“Você é a garota tentando sair do 734, não é?” Ela me pegou de surpresa. “Sim, uma delas. Como você sabe?”
“Desculpe, eu ouvi sua conversa. Eu vi também seu pedido de mudança alguns dias atrás, e eu preciso perguntar, qual o motivo da transferência, exatamente?”
Eu estava cansada... Exausta na verdade. Não estava com cabeça pra pensar numa mentira.
“Porque tem umas merdas acontecendo no quarto vizinho e está nos assustando, barulhos, sussurros, batidas e na última noite eu vi alguém.”
“Você viu alguém?”
“Sim.”
“No quarto 733?”
“Sim, eu olhei por baixo da porta. Tinha definitivamente alguém lá.”
A garota me fitou por um momento e então acenou com a cabeça sem motivo algum. “Bem, seus quartos ainda não estão prontos, mas eu fiz com que eles se tornassem prioridade, por enquanto você está sem saída. Não tenho onde colocar você agora.”
Eu suspirei, já imaginava.
“Eu sou a Alice,” ela continuou “e, olha, eu já fiz muitas pesquisas sobre os suicídios no 733 e eu acho que posso ajudar, ou pelo menos tentar te dar outra perspectiva.”
“Sério?” Eu perguntei hesitante.
“Sim. Eu estou no Taylor Hall, quarto 310. Eu vou sair do trabalho ás 16:00 hoje.”
“Obrigada, nós acabamos de sair da Sociedade Paranormal do campus.”
“Ok, não precisa falar mais nada.” Ela disse, rolando os olhos.
“Hum, então eu vejo você ás 16:00?”
“Ótimo.”
Eu cheguei mais cedo no dormitório da Alice, e ela já estava lá. Eu contei nossa história pela segunda vez naquele dia e Alice não teve medo de interromper com algumas perguntas, ela estava interessada. Quando eu acabei ela encostou na cadeira e suspirou profundamente.
“Não posso acreditar,” Ela fez que não com a cabeça. “Eu sempre ouvi rumores, mas honestamente? Sempre duvidei que fosse verdade.”
“Eu posso jurar que tudo que lhe contei é verdade.”
“E como é agora? Quando você está lá?”
“Nós não ficamos lá durante a noite, mas durante o dia escutamos arranhões nas paredes, alguns sussurros baixinhos e ás vezes nós ainda escutamos as janelas abrindo e fechando. Em plena luz do dia, mas toda vez que eu olho as janelas ainda estão abertas.”
Alice fez que sim com a cabeça. “Bom, eu não acho que você esteja em perigo, mesmo sabendo que incomoda, é simplesmente acaso, poderia acontecer com qualquer outra pessoa. Vocês só precisam ficar fora do quarto 733.”
Eu bufei. “Você está brincando? Eu nunca entraria lá.”
“Eu acredito que você acredite nisso, mas seja o que for isso, é manipulador, inteligente e mentiroso. E é mais esperto que você.”
“Estou tentando não ficar ofendida com isso.”
“Não fique, eu não quis ofender.”
“O que você acha que é?”
“Algo muito antigo e muito maldoso.”
Eu analisei a resposta e deixei meus olhos passearem pelo quarto dela pela primeira vez desde que entrei, eu não havia notado a decoração antes, mas observando melhor dava pra perceber que ela tinha muito interesse no oculto.
“Eu não consigo imaginar nenhum tipo de situação que me colocaria naquele quarto.”
“Eu sei, mas você tem que estar preparada que em algum momento você terá que tomar uma decisão sobre entrar ou não naquele quarto. Afinal, com o que você está lidando? Já matou 5 pessoas.”
“5? Eu achei que fossem 3!”
“Bom, nem todo mundo fez o tipo de pesquisa que eu fiz. Vamos ver, teve Ellen Burnham em 1961 – ela pulou da janela e foi a primeira de todos. E então, Tad Collinsworth em 1968 – ele pulou também. Marissa Grigg, em 1975, ela se enforcou. Erin Murphy, em 1979 – saltou da janela. E finalmente Erik Dousten, em 1992 – se enforcou.”
“Cinco suicídios? Como ainda existem alunos morando naquele quarto?”
“Não existem, aparentemente é um quarto de suprimentos.”
“E antes?”
“Os que sabiam se graduaram e os novatos não sabiam de nada, a internet não era o que é hoje, então eles chegavam aqui sem saber de nada sobre isso... Até a última morte, Erik Dousten – foi aí que eles fecharam a ala norte e construíram a ala sul.”
“Então o que ele quer?”
Alice deu de ombros. “Caos, mortes, almas... Quem sabe? Ninguém nunca soube o que é.”
“E o que nós sabemos?”
“Bom, nós sabemos que tem uma conexão com o quarto e pouca influencia fora dele, sabemos que os que morreram estavam sozinhos e sabemos que ele é esperto. Só isso.”
Não era suficiente. “Você tem um palpite do por quê?”
“As vítimas?”
Eu fiz que sim com a cabeça.
“Tudo que eu sei é o que está nos arquivos de evidencia, todos os suicídios foram encontrados com fotos e imagens que naquela época eram ilegíveis. Elas continham coisas horríveis e diabólicas que provavelmente fariam você se sentir mal só pela leitura.”
“E foram essas pessoas que desenharam e escreveram isso?”
“Aham, seja o que for que esteja lá, os deixou malucos.”
“Isso é assustador.”
“Vocês já consideraram chamar alguém para benzer o lugar?”
“Meu Deus, o que?”
“Bom, talvez vocês demorem pra pegá-lo, mas quem sabe... com ajuda de alguém da igreja.”
“Você está falando sobre um exorcismo.” Alice deu de ombros novamente, “Talvez. O rumor nos anos 70 foi que tudo começou com uma partida de Ouija que deu errado em 1961.”
“Sério? Aquela merda é feita pela Hasbro.”
“Não nos anos 60... Mas de qualquer forma é apenas um rumor. A única pessoa que saberia disso é o Tom Moen, da administração. Eu tentei falar com ele, mas ele se recusa a me ver.”
“Ele estava aqui em 1961?”
“Sim, e ele estava no seu prédio.”
“Nós precisamos falar com ele, precisamos saber o que diabos está acontecendo ou eu não conseguirei viver o resto da minha vida como uma pessoa normal.”
“Nós podemos tentar achar ele no campus.”
“Podemos falar com ele amanhã?”
“Podemos tentar.”
Sr. Moen não nos viu nem naquele dia e muito menos no próximo. Nós tentamos falar com ele na hora do almoço e novamente quando ele estava saindo do trabalho... Estava claro que o velho nos evitava.
Lydia e eu não nos vimos muito depois que decidimos continuar dormindo em outros dormitórios. Eu ia ao meu quarto duas vezes no dia – uma vez de manhã e outra de tarde. O quarto geralmente estava silencioso, mas isso não fazia eu me sentir melhor. Eu sempre sentia algo errado do outro lado da parede, algo me observando. Parecia a calma antes da tempestade.
Na Quinta-Feira antes do Halloween eu fui ao dormitório tomar banho, um pouco mais tarde do que o normal, mas ainda assim não era noite. Eu tinha visto Lydia mais cedo e ela me disse que tinha muitas roupas no outro dormitório então eu sabia que não a veria essa noite.
Eu tomei banho no final do corredor e fui para o meu quarto trocar de roupa. Eu ia encontrar o Ian e ir para uma festa, então eu só queria dar o fora o mais rápido possível.
O silêncio também estava me deixando nervosa então eu liguei meu Ipod e AC/DC começou a tocar.
Eu me vesti e fiquei na frente do espelho secando meu cabelo, eu abaixei minha cabeça por um momento e comecei a correr meus dedos nos fios do meu cabelo, tentando dar algum volume. Assim que eu olhei para o espelho novamente percebi que a música já não tocava mais.
Mas isso não foi a única coisa que eu percebi.
Não era mais o meu quarto, atrás de mim estavam as cabeceiras das camas enferrujadas e empoeiradas e as enormes janelas do 733. Eu olhei pra trás em pânico e percebi que eu realmente estava no meu próprio quarto.
Olhei para o espelho novamente e vi o 733ainda refletido lá, fiquei paralisada por um momento pensando no que fazer, mas um pequeno movimento perto de mim foi o que me fez correr.
Eu agarrei minha bolsa e o celular e sai do meu quarto batendo a porta atrás de mim, assim que o elevador chegou, eu liguei para Alice.
“Não posso fazer mais isso,” Eu disse assim que ela atendeu. “Não posso voltar naquele quarto outra vez, nunca mais.”
“O que aconteceu?”
Eu contei a ela.
“O que você quer fazer?” Ela perguntou.
“Eu preciso falar com alguém que saiba o que está acontecendo, Tom Moen é o único que estava aqui em 1961?”
“Que eu saiba o único, talvez a gente consiga falar com ele amanhã pela manhã? Nós vamos encurralá-lo e não vamos sair de lá até eles nos contar algo. Ele sempre chega ás 6:30, você quer me encontrar na frente do Starbucks no Atrium?”
“Quero! Eu tenho aula ás 7:30 mas eu vou filar.”
“Ok, vejo você lá.”
Eu nunca gostei muito de festas, mas eu estava feliz que fui pra uma, assim que chegamos lá pedi a Ian uma bebida. Eu não sou muito de beber e ele me deu o copo com as duas sobrancelhas erguidas.
Eu expliquei o que havia acontecido brevemente pra ele, esperando que ele não me chamasse de louca.
Ian me deu uísque e coca, apenas a primeira dose de muitas.
Eu saí da casa pra fumar e olhei meu celular, tinha uma mensagem de voz da Lydia, deixada ás 23h04min.
“Oi, becca. Escute, eu só... ugh. Eu tive uma briga com o Mike. E ele, quer dizer, eu acho que a fraternidade dele decidiu que todos os calouros têm que passar a noite no quarto do suicídio, no nosso dormitório, eu simplesmente não entendo... Ele sabe o que têm acontecido conosco e ele ainda assim aceitou isso. Ele agora quer me convencer de que Sigma Chi está por trás disso tudo que vem acontecendo no 733 porque eles já vem preparando todos para a brincadeira de Halloween. Eu não—”
Eu finalizei a gravação e botei meu celular na bolsa, era compreensível que a Lydia estivesse puta, isso não era bom. Não mesmo.
Eu achei Ian e pedi que me levasse pra casa, eu estava muito estressada, muito cansada e muito bêbada.
Quando o alarme tocou ás 06:00 eu tive que usar todas as forças do meu corpo pra sair da cama. Eu me vesti com as mesmas roupas que usei na noite passada e atravessei o campus em direção ao Atrium.
Alice já estava lá me esperando com um copo de café preto nas mãos, “Achei que você fosse precisar disso.” Ela sorriu.
“Como você sabe?”
“Suas mensagens.”
“Eu mandei mensagem pra você ontem?”
“Sim, ás 01:00,você me contou sobre Sigma Chi.”
“Ai, meu Deus. Sim...” Eu tirei os óculos.
“Aqueles caras são uns idiotas! Lembra quando eu te disse que aquilo era esperto? E se o motivo de estiver mexendo com você era fazer o quarto ficar provocativo, entende? Pra seduzir a pessoas e fazer com que elas entrem. Ninguém entra lá há anos, você pode imaginar o quão desesperado aquilo está?”
“Você acha mesmo que eles estão correndo risco?” Eu perguntei e sentei no meio-fio do prédio.
“Sim... na verdade a única coisa a favor deles é que todas as outras vítimas estavam sozinhas na hora que morreram.”
“Então fica menos poderoso quando tem mais gente?”
“Teoricamente. Nós saberíamos muito mais se tivéssemos uma idéia do que é, e nós não podemos saber o que é sem saber como chegou lá, e é por isso que precisamos do Moen.”
“Que horas ele chega?”
“Na verdade, 20 minutos atrás.” Alice disse com um sorriso nos lábios.
Levamos 1 hora e meia pra perceber que o Sr. Moen havia nos evitado novamente, nós fomos ao escritório e imploramos por uma visita com ele de qualquer jeito.
A mulher na recepção nos recebeu friamente. “Tom não está vindo hoje, nem algum outro dia. Ele pediu demissão ontem, parece que vocês não irão incomodá-lo mais.”
“Não estávamos incomodando ele.” Eu disse. “Nós só precisávamos falar com ele desesperadamente.”
“Ainda precisamos.” Alice completou.
“Bom, vocês não vão conseguir nada sobre a vida pessoal dele comigo.” Ela disse por último e começou a caminhar.
“Que porra a gente faz agora?” Eu perguntei a Alice.
“Com o Tom não temos mais nada a fazer,”
“Alice, merda, eu não posso voltar naquele quarto.”
“Bom, então espero que você fique feliz em saber que suas transferências chegaram.”
“Chegaram?”
“Sim, eu vi a noticia quando chequei meu e-mail hoje mais cedo. Você vai para Morton e Lydia vai para Tinsley.”
“Ah, obrigada Deus.”
“Eu achei que você fosse gostar disso, eu convenci meu chefe a não colocar mais ninguém no quarto 734.”
“Ainda bem.”
“A única coisa é que você não pode se mudar pelo menos até Segunda.”
“Eu posso durar um fim de semana, especialmente agora que sei que acabou. Tenho que contar pra Lydia.”
Eu peguei meu celular e ia discar o numero da Lydia, mas minha atenção foi chamada para o ‘1’ vermelho no canto da tela, que indicava uma mensagem de voz. Eu apertei play, era o resto da mensagem da noite passada.
“—nem olhar mais pra aquela cara estúpida dele então eu vou pra casa. Não se preocupe, vou ficar bem, estou bêbada o suficiente pra conseguir dormir e ignorar qualquer barulho do quarto vizinho. Só estou realmente irritada agora, eu ia preferir lidar com a Beth Imbecil do que com o Michael-meus-pais-devem-ser-gemeos-porque-eu-sou-muito-retardado-Benson. Vamos sair amanhã? Te amo!”
“Merda.”
Alicia me olhou, questionando silenciosamente.
“Lydia dormiu no nosso quarto.”
Alice encolheu os ombros. “Mas ela está bem, não está?”
“Se ela não entrou no 733.”
“Ela não entrou.” Eu pensei nas grandes janelas nas paredes, só aquilo faria com que Lydia ficasse bem longe daquele quarto.
“Hum, então ta. Já que não temos nada pra fazer, quer ir à biblioteca e olhar uns livros de teologia? É a única coisa aberta á essa hora.”
“Claro.” Eu dei de ombros, não tinha aula até ás 10.
A senhora que estava na biblioteca parecia ter mais de 1000 anos de idade, Srª. Stapley. Os olhos dela eram pequenos e aguados e a pele do rosto dela parecia derreter o tempo todo.
Ainda assim, ela era lúcida e nos mandou para a ala certa quando perguntamos sobre demonologia, mesmo estando com um olhar curioso no rosto. Nós lemos algumas coisas, mas não encaixava com nosso caso e o que talvez pudesse encaixar, não estava em inglês.
30 minutos depois nós retornamos para a mesa dela.
“A senhora tem alguma coisa relacionada ao ocultismo?”
“Ah, o oculto. Sim...” A voz dela sumiu por um momento. “Logo ali á direita.”
“Obrigada e desculpe.”
“Eu não acho que ela goste de nós.” Alice sussurrou enquanto nós íamos em direção aos livros.
“De nós ou dos nossos interesses?”
“Os dois.”
Uma hora depois nós retornamos a mesa dela e ela nos fitou enquanto nós andávamos, ela parecia estar suspeitando de algo.
“Hum, desculpe. Mas a senhora sabe onde nós podemos encontrar algum tabuleiro Ouija ou—”
“Escutem aqui, garotas,” Srª. Stapley levantou da cadeira e encarou nós duas intensamente. “Eu realmente espero que isso seja para alguma aula.”
“E é.” Eu disse.
“Não é não.” Alice disse simultaneamente, “É uma pesquisa pessoal.”
“Pesquisa? Que tipo de pesquisa?”
“Olha, nós não vamos destruir nada com o tabuleiro de Ouija ou algo do tipo...” Eu disse.
“Bom mesmo.” Ela disse e ajeitou a roupa antes de sentar novamente. “Porque eu não posso ter esse tipo de coisa acontecendo aqui.”
“De novo?” Alice retrucou.
A mulher mais velha pareceu desconfortável por um momento e começou a analisar uma pilha de livros que estava em sua mesa.
“Talvez nós tenhamos algo—”
“Srª. Stapley, nós queremos informações sobre o que aconteceu em 1961.” Alice interrompeu. “E também sobre o que vêm acontecendo desde então.”
“Não é um segredo, é? Um estudante cometeu suicídio naquele quarto, horrível, mas não é raro em nenhum campus universitário.”
“5 estudantes.” Eu a corrigi.
“Mas a senhora sabe disso, não é?” Alice começou a falar rápido. “Porque você soa como se você soubesse muito bem essa história. Por favor, nos diga como começou e talvez nós possamos pôr um fim.”
“Pôr um fim?” Srª. Stapley falou e sua voz parecia mais calma e concentrada. “Não seja arrogante, mocinha. Você não pode pôr um fim nisso. Pessoas sempre morreram naquele quarto e elas vão continuar morrendo, não existe fim e é melhor você ficar fora disso.”
“Mas talvez se nós soubéssemos como começou...”
“Começou como você acha que começou, mas todos os envolvidos ou estão muito velhos ou muito mortos hoje. Apenas fique longe do quarto, se concentre nos estudos.” Eu me apoiei na mesa. “Eu adoraria, mas eles me colocaram junto com a minha amiga no quarto vizinho, talvez você consiga esquecer sobre os suicídios, mas nós não, aquilo não deixa.”
“Mocinha, eu nunca esqueci.” Srª Stapley disse e sua voz estava ainda mais calma do que antes.
“Minha amiga Ellen foi a primeira a morrer naquele quarto. Ela era minha melhor amiga, e não tem uma noite que eu não pense nela tentando sair daquela janela minúscula e depois pulando do sétimo andar do prédio.”
Alice suspirou. “Desculpe, eu não sabia.”
“Bom, são apenas memórias, querida. Agora garotas, eu sugiro que vocês peçam outro quarto urgentemente, ninguém deveria estar no sétimo andar daquele prédio, e isso é tudo que eu vou dizer sobre o assunto.”
Alice suspirou e não disse nada, apenas acenou com a cabeça. Nós não iríamos descobrir mais nada aqui, mas mesmo assim, estávamos em uma situação melhor... Pelo menos tínhamos alguma informação.
Alice começou a andar e eu quase a segui, mas tinha algo me incomodando no que a Srª. Stapley havia dito. Só um pequeno detalhe.
“Srª. Stapley,” Eu disse e a cansada velhinha me olhou, “Por que você se referiu ás janelas do 733 como minúsculas? Porque eu já vi aquelas janelas e elas são gigantes, tipo, 1 metro de altura.”
“Querida, você está falando do quarto de suprimentos. O quarto 733 é do lado dele.”
“N—ão, não.” Eu estremeci, “aquele é o quarto 734.”
“Bom, é agora, quando eles construíram quartos na ala sul todos os quartos diminuíram um número.”
Meu Deus, eu me senti tonta e parecia que eu ia cair a qualquer momento.
“Merda.” Alice sussurrou perto de mim.
“Lydia.”
Nós corremos pelo campus como se estivéssemos em maratona, apenas alguns alunos nos viram e nos olharam com o cenho franzido, quando meu prédio apareceu no meu ponto de vista eu senti meu sangue gelar.
As janelas do quarto estavam fechadas, era a primeira vez que eu via isso desde o primeiro incidente das janelas.
E a janela do meu quarto estava aberta, Lydia nunca deixava a janela aberta.
Nós corremos pelo lobby, passando por alguns calouros que haviam chegado naquele momento e pegamos o elevador, eu apertei no botão 7 e vi as portas fecharem mais lentamente do que em todo o tempo que eu estive lá.
Eu encostei-me à parede, tentando respirar normalmente e virei para Alice. “Como isso aconteceu?”
“Eu não tenho ideia alguma!”
“Ela ficou lá a noite toda, Alice. No nosso quarto. Sozinha.” Alice fez que não com a cabeça mas não disse nada, quando as portas finalmente abriram a única coisa a nossa frente era um calmo e escuro corredor. Eu corri até minha porta com Alice atrás de mim e usei toda a força para abrir a porta do quarto, o que foi desnecessário afinal a porta não estava trancada.
Lydia me olhou de volta assim que entrei no quarto, e por um pequeno, cruel e doloroso momento um raio de esperança passou pelo rosto dela.
Mas era tarde demais, no segundo seguinte ela estava recostando no nada, tão delicadamente, e então se foi.
Ela gritou até alcançar o chão.
Alice correu até a janela e colocou a cabeça pra fora e eu fiquei parada, enquanto eu observava Alice levar as mãos até a boca e colocar a cabeça pra dentro do quarto novamente, o rosto dela estava branco como neve.
Os gritos lá fora ficaram maiores assim que as pessoas viram o que restava da minha melhor amiga no asfalto frio. Eu recostei no armário e suspirei.
Ela se jogou da janela... Lydia nunca se jogaria da janela.
Eu vi algumas fotografias jogadas no chão e comecei a desvirá-las. A mãe de Lydia estava em uma delas, ela está morta. Na outra, vi a irmã mais nova de Lydia, que também estava morta. Haviam dúzias de fotos como essas no chão, Lydia ficou bastante ocupada na noite passada. Eu não prestei muita atenção em todas, no entanto, a da irmã dela foi a última que vi antes de cair no chão.
Alice estava na porta, gritando algo que eu não compreendi porque a única coisa que eu conseguia ouvir era minha própria lamentação.
Um pedaço de papel escapou no do armário e eu o peguei, era um desenho de Lydia, eu o abri.
Não era como os outros, era o closet, como se ela tivesse visto do meu ponto de vista no dia que achei que era ela escondida nele, a porta estava meio aberta e tinha algo olhando pra fora.
Eu fitei a imagem e tentei ver dentro do closet, e assim que eu comecei a achar que tinha visto algo, Alice me puxou pelo braço.
“Nós temos que sair daqui.” Eu acho que ela disse.
Eu nunca voltei naquele quarto. Meus pais foram buscar minhas coisas e eu passei o resto do semestre em um apartamento fora do campus. Eu peguei minha transferência assim que o semestre acabou e eu me formei fora do estado.
Toda noite eu sonho com Lydia, tentando sair da minúscula janela, se esfregando na beirada fria, parando lá e sabendo que não haveria nada entre ela e o asfalto. Eu vejo o horror no rosto dela, eu ouço a batida feroz do seu coração, desesperadamente tentando reviver cada momento da vida que ela perdeu, mesmo sabendo que foram apenas durante poucos segundos enquanto ela caía.
Eu a vejo olhar pra mim, eu a vejo cair.
Isso aconteceu 9 anos atrás, e todo semestre eu procuro saber quais são os dormitórios disponíveis para calouros. Reilly está sempre disponível.
O sétimo andar está fechado.
“Você estava perguntando sobre quartos disponíveis em Reilly?”
“Sim, isso mesmo.”
“Há uma lista de espera grande, mas talvez você tenha ligado na hora certa. Não posso prometer nada, mas talvez você ache um quarto, nós conseguimos a aprovação hoje—”
“Aprovação para quê?” Eu disse lentamente.
“Nós estamos reabrindo o sétimo andar.”
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